domingo, 7 de novembro de 2010

Análise da Google TV por um usuário

Sorte que lá você pode testar e se não gostar devolver.


A Best Buy está quase vazia, é uma quinta-feira meio de tarde e eu estou de férias. A seção de HDTVs está igualmente vazia, mas o stand dos produtos Google TV está ocupado. De um lado, a Sony entrou com o pé alto: uma HDTV com o Google TV embutido em um controle que lembra o joystick do saudoso Jaguar. Jaguar, aquele videogame que quase acabou com a Atari, que já foi o Google dos videogames. Acho graça do pensamento…
Resolvo experimentar o Google TV ainda no stand da Best Buy. Ambos estão desconectados da Internet. Sim, as pessoas passeiam pelo menu do bicho offline. Sem conexão, sem diversão. Ou nuvem, ou nada. Decido checar os modelos e valores.
As duas primeiras empresas a entrarem na empreitada foram a Logitech e a Sony, cada uma com uma proposta diferente para te empurrar o bicho. A Logitech oferece o Revue (que em francês quer dizer algo como “um show de variedades, musica, teatro, dança…” chique, não?), um conjunto básico com o box em si e um teclado QWERTY+trackpad sem fio, tudo por US$ 299. Trezentos dólares é o valor mínimo para começar a brincadeira. Eu posso comprar um PS3 com trezentos mangos.
O outro kit disponível vem com uma câmera, ou TV Cam, que me permite falar e ver outros amigos que estiverem na frente da TV com o mesmo aparelho. Aparentemente, a câmera só funciona para quem usar o serviço Logitech Vid, ou seja, nem no GTalk funciona e seu contato precisa ter uma camera Logitech. Preço: US$ 460, e sem piar. Curiosamente, a Sony me oferece um kit de Google TV com um Blu-ray player e um controle menor (aquele que parece o Jaguar) por US$ 400. Ora, uma webcam custando mais que um Blu-ray player? Mundo louco este.

Resolvo levar o kit básico da Logitech. O vendedor me pergunta se vou “experimentar” (to try, um termo muito dúbio em inglês) o Google TV. Eu respondo num sorriso qual o prazo de retorno dele. Ele ri e diz que são três dias. “Te vejo daqui três dias”.
Chego em casa com o Revue e vamos para o unboxing! Nada excitante. É um produto Logitech, e parece que estou desempacotando um mouse que peguei no almoxarifado.
Caixa do Logitech Revue. (Clique para ampliar)
A ciência do Revue é ser um intermediário entre o meu DVR e a HDTV. Nada complicado. A saída do DVR vai pro Revue e este sai diretamente para a TV. Cabo HDMI extra incluso no pacote. Agradecido! Quanto à Internet, conexão sem fio, tranquilidade total.
Taquei fogo no bicho e comecei as configurações. Ele avisou que levaria 20 minutos e eu ri. “Vinte minutos para conexões mortais. Eu tenho 20 mbps, baby!” pensei, triunfante. Ledo engano. As configurações do Revue são demoradas. E chatas. E, algumas vezes, idiotas.
Atualizações do Revue. (Clique para ampliar)
A idéia do revue é concentrar todas as funções dos controles remotos no teclado do Google TV, então, a configuração pede coisas absurdas como identificar qual a empresa regional que me provê TV a cabo, o modelo da minha TV e, pior, quais os canais que eu assino. Digamos que no meu plano são mais de 80, só falando dos em alta definição.
Outra coisa estranha foi o Google me perguntando, depois que entrei com minha Google Account, se eu o autorizava a colher informações sigilosas. Claro, claro… que não!
Findada a parte chata, vou para a ação. O menu é bem simples: um bookmark para colocar as minhas funções mais frequentes e os apps nativos do aparelho. Nada de Android Market, provavelmente os novos aplicativos serão inclusos via update. Será engraçado ver minha TV fazendo atualização. Não, nada engraçado!
Como um piador viciado, comecei a brincadeira querendo dar um “Hello, World” pelo app do Twitter, que é bem simples. E lento, muito lento. Não consegue me retornar as replies em tempo. Eu preciso clicar em “atualizar” a cada minuto. Espera, eu tenho um browser no Revue! Acesso a versão web do Twitter e funciona muito melhor.
Passo o olho na lista de aplicativos e nada me anima: Pandora, Napster, Chrome, YouTube e acho que só isso… Não encontro serviços básicos do Google como  Gmail, GTalk ou um Google Maps, por exemplo. Um serviço de vídeos da NBA e outro da CNBC (um canal de notícias). Espera, Amazon On Demand! Dá pra comprar filmes online, no melhor estilo AppleTV! Vou assistir a um filminho, então.
Meu entusiasmo dura pouco. Os vídeos a venda no Amazon ainda não estão disponíveis em… HD! É absolutamente frustrante você pagar mil dinheiros numa TV de alta definição, depois mais 300 dinheiros numa caixa idiota com um teclado QWERTY e não poder pagar pra ver um filme em alta definição.
Nada de filmes em alta definição pra você... (Clique para ampliar)
Minha operadora de TV oferece filmes sob demanda. Achei os mesmos filmes, em 1080p, direto pelo cabo, e ainda salvo o consumo de conexão. Adeus, Amazon On Demand.
Uma amiga me chama para papear no Gtalk via webcam. Eu não comprei o kit do Revue com câmera, mas eu tenho uma Logitech Pro 9000, uma webcam top de linha que transmite imagens em até 720p. Por que não tentar?
Minha webcam não serve. Eu já paguei US$ 79 numa webcam, por que esta outra custa US$ 149? Esse é o preço de uma câmera digital de verdade. Sinto falta do meu laptop. E eu ainda não consigo mudar os canais usando este maldito teclado!
Estranho esse teclado. Tem três botôes de entrada de dados: um clássico Enter, um outro chamado OK, que fica no meio dos botões navegadores, e o “click” tradicional do trackpad. Isso queima minha cabeça. Eu nunca acerto qual usar. Enter para textos, mas às vezes serve para clicar num ícone. O trackpad só com o ponteiro apontado, mas às vezes clico em OK, intuitivamente, e vou pra outro lugar. Aí preciso apertar o “backspace”, ou um outro botão com uma seta… mas nem sempre. GRRRRRRR!!!!
O teclado é fino, leve e compacto, mas levar um teclado pro sofá é algo absolutamente incômodo. Eu não acho posição para usar. Fazer uma pesquisa deitado no sofá é algo que não dá… Eu preciso me sentar formalmente para usá-lo. Mas um teclado? Ah, tem aquele controle da Sony, que parece o controle do Jaguar, aquele videogame que foi um fracasso. Deixa pra lá…
Teclado do Logitech Revue. (Clique para ampliar)
O Google TV é baseado em Android 2.2 “FroYo”. Acredito. Para a prova, resolvo tentar alguns sites de vídeo não-YouTube. Metacafe.com entrou. Bugou na primeira vez, mas funcionou na segunda. O YouTube me ofereceu vídeos, os disponíveis, em 1080p. Isso é até empolgante, da mesma forma que é frustrante ver vídeos de 360p no canto de uma tela de 42 polegadas.
O Cardoso, no Twitter, está empolgadíssimo com um evento ao vivo do Jon Stewart, transmitido pelo canal Comedy Central. Eu não lembro o número do canal, puxo a busca do Google  TV e digito “Jon Stewart”. Todos os retornos são para vídeos no YouTube e o site oficial. Ele não sabe que o Jon Stewart está com um programa naquele momento. Entro com “Comedy Central” e ele me retorna o número do canal. Ora, meu controle remoto também sabe procurar assim… E o Google TV não tem habilidade de me mostrar a minha grade de programação. Para isso, eu tenho que usar o menu original do DVR. Eu sinceramente esperava não precisar de ajuda daquilo que eu já tinha.
Quando estou assistindo apenas à TV, posso chamar todo o menu e funções do Google TV, e jogar a TV para uma tela menor, no canto inferior direito. Em um momento, preciso clicar num botão que está no canto inferior direito, mas tem um “TV” na frente. Não posso mover a tela, nem redimensioná-la. Minhas opções são voltar para a TV em tela cheia ou fechar a telinha. Opto pela segunda opção e termino por clicar no botão. Quero minha tela da TV de volta. Não dá. Só se eu sair da página que estava lendo, entrar na TV e chamar o menu, novamente.
Google TV sequestrando a tela. (Clique para ampliar)
Sportcenter transmitindo melhores momentos do jogo do Lakers na noite anterior. Lembrei de um vídeo no YouTube com as melhores jogadas da carreira do Kobe Bryant. Jogo o Sportcenter para a telinha (aquela do canto inferior direito) e faço a busca do vídeo. O vídeo começa, mas tem som, e o Sportcenter também está falando. Agora tenho dois vídeos cheios de som na minha TV. Não entendo nada. Minha atenção é para o YouTube, mas eu não sei como baixar o volume da TV. Se eu diminuo o volume da TV, o volume do YouTube também diminui. Me irrito com o vídeo, com o Sportcenter, com a resolução baixa, com esse teclado de 20 mil botões.
Resolvo dar uma olhada nos serviços oferecidos, alguns pagos. Nada novo. Tem um do canal HBO. Eu tenho HBO na TV a cabo e tenho um vasto menu dedicado à HBO direto pelo serviço da TV a cabo. Talvez encontre algo da ABC, afinal posso ver várias séries de graça no site oficial deles. Nada da ABC, nem da Fox, nem Discovery, nem nada mais. Mas isso tudo tem no Hulu. Meu PS3 tem Hulu. Meu laptop tem Hulu de graça. Nem me animo de registrar o Netflix. O xbox 360 já tem também. Também o PS3, o iPod touch… Aliás, até o Roku e o futuro Boxee têm mais serviços de mídia que o Google TV, custando muito menos que ele (e o controle/teclado do Boxee é uma graça).  Afinal, não tem nada exclusivo e bacana no Google TV? Pandora, ORLY?!?
Como minha amiga me chamou de novo para papear no Gtalk, vou no quarto e pego meu laptop. Em poucos minutos estou conversando com ela, vendo videos do YouTube, checando meus email e atualizando meu Twitter. Ah, minha TV está na minha frente, em tela cheia me mostrando o jogo da noite. Quem precisa de um Google TV de US$ 300? Um netbook custa menos que isto.
Dois dias depois da compra, volto à BestBuy com o Revue embaladinho, pronto para o retorno. O vendedor me pergunta se não gostei. Eu respondo com um sorriso e um gesto negativo com a cabeça. “Eu acho que as pessoas não estão preparadas para o Google na TV de casa”, diz o rapaz.
Não. Na verdade a Internet ainda não está preparada para entrar nas TVs de casa. Muito menos o Google.


http://meiobit.com/75982/analise-google-tv-logitech-revue/

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